quinta-feira, 1 de julho de 2010

Solidão que une

Ontem assisti a um filme perturbador em dvd: "Ander", filme falado em basco e espanhol, com legendas em espanhol. Ander era um homem de quarenta anos que dividia suas tarefas numa fábrica de bicicleta com a vida no campo. Morava com sua mãe velha, moralista e autoritária, que se negava a falar espanhol com quem não fosse basco. Havia também a irmã, que estava prestes a casar.
Um dia, Ander sofre um acidente e quebra uma das pernas. Foi preciso contratar um ajudante rapidamente. Encontraram um peruano, Juan, que estava na região à procura de trabalho. Ele é contratado, apesar da objeção da mãe, por ser estrangeiro.
Aí a história ganha interesse: os dois tornam-se amigos e Ander descobre sentimentos que até então desconhecia. Busca aproximar Juan da família, contra a vontade da mãe. Na festa de casamento da irmã, Juan leva Ander ao banheiro, para ajudá-lo a urinar; Juan demonstra-lhe fisicamente seu afeto. Fazem sexo - Juan penetra Ander, que se desestabiliza, a partir de então.
Logo em seguida sua mãe morre. Os dois passam a viver sozinhos no sítio. Juan passa a ser maltratado. Ander trata-o com desprezo, mas vai conseguindo observar a dedicação do empregado para com ele e as coisas da casa. Sente a crise, vê seu relacionamento com amigos e parentes se modificar, e precisa decidir se deseja realmente incluir Juan em sua vida.
O que me chamou a atenção no filme foi que a solidão de Ander, assim como a de Juan, pediam a presença um do outro. Viver solitariamente é uma arte difícil de se aplicar na vida de alguém. Viver junto é bacana, mas difícil. Viver sozinho também é bacana, se for mais que uma opção, uma filosofia de vida. Permitir a presença do outro em nossas vidas requer uma política de relacionamento muito bem articulada. O amor (e a amizade), para criar raízes, precisa ser administrado com razão e sentimento.
Ander, que vivia solitariamente em seu cotidiano, fazendo sexo evetualmente com uma prostituta, descobriu a necessidade do amor na figura suave de Juan, que demonstrava seu carinho na maneira discreta de ser e agir.
O filme carrega outras simbologias interessantes: a atração que Ander sente por Juan começa situada na dominação do forte pelo fraco. O relacionamento dele com a mãe, a rigidez da educação que quando se desfaz, com a morte dela, deixa Ander desorientado. A homofobia de Ander, o moralismo da cultura espanhola, em termos mais abertos, enfim, o filme é riquíssimo. Pena que dificilmente circule nas telas brasileiras, não é filme fácil de se ver. Na Espanha ele foi proibido. Circula em festivais gueis, onde já ganhou prêmios, mas a temátima homossexual não é a bandeira do filme. Vale a pena vê-lo!
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Ander, Direção: Roberto Castón
Elenco: Joxean Bengoetxea, Christian Esquivel, Mamen Rivera

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