Dessa vez, vamos comentar um livro sobre os romances. A verdade das mentiras, de Mário Vargas
Llosa, debruça-se sobre 36 romances do século XX, que ele selecionou e releu,
muitos anos depois, para analisar aspectos dessas obras,
diferentemente da intenção primeira que o autor teve, ao lê-las pela primeira
vez, quando jovem. Lançado em 2002, contém ensaios independentes selecionados
arbitrariamente e ligados por um denominador comum: de que a missão do romance
é mentir de forma persuasiva, passar por verdade as mentiras.
Vargas começa afirmando que, de fato, os romances mentem, pois
não podem fazer outra coisa. Mentindo, expressam uma verdade curiosa que só
pode se expressar escondida, disfarçada do que não é. Isso acontece porque os
homens não estão contentes com seu destino rico ou pobre, medíocre ou genial,
célebre ou obscuro: gostariam de ter uma vida diferente da que vivem. Por isso,
nos diz Llosa, surgiu a ficção. Na ficção, os leitores podem ter as vidas que
não se resignam a não ter. No embrião de todo o romance ferve um inconformismo,
pulsa um desejo satisfeito.
Mas, Vargas Llosa adverte: isso não significa que o romance
é sinônimo de irrealidade. A verdade e a mentira no mundo da ficção estão
semeados de armadilhas. Não se escrevem romances para contar a vida, mas para
transformá-la, acrescentando-lhe algo. Todos os romances refazem a realidade, embelezando-a
ou piorando-a. Nesses acréscimos sutis ou grosseiros à vida, nos quais o
romancista materializa suas obsessões secretas, reside a originalidade da
ficção.
Isto posto, ele nos fala de O coração das trevas (Conrad), Morte
em Veneza (Mann), Dublinenses
(Joyce), Mrs. Dalloway (Woolf), O grande Gatsby (Fitzgerald), O lobo da estepe (Hesse), O estrangeiro (Camus), A revolução dos bichos (Orwell), O velho e o mar (Hemmingway), Doutor Jivago (Pasternak), O tambor (Grass), Afirma Pereira (Tabucchi) e mais 24 obras que fizeram sucesso no
século XX. Trata-se de ensaios curtos – média de 6 a 7 folhas, escritos de
forma brilhante, numa linguagem acessível, discorrendo
sobre o propósito da literatura, o futuro dos livros e o modo como a ficção
transforma nossa experiência vital.
A tradução excelente é de Cordelia Magalhães. Lamentavelmente,
estamos diante de mais uma obra de qualidade esgotada. Mas não desanime, nos
sebos virtuais é possível encontrar um exemplar seminovo por um preço médio de
33 reais. Mas compre logo, porque são poucos disponíveis!
paulinhopoa2003@yahoo.com.br
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Mario Vargas Llosa. A verdade das mentiras. 3ª ed, SP, ARX,
2004, 368 pp.
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