O Continente compreende dois
volumes iniciais da trilogia O Tempo e o
Vento, do escritor gaúcho Erico
Veríssimo (1905/1975). O primeiro volume, que nos interessa aqui, narra o final
da Revolução Federalista no Rio Grande do Sul (1893/1895) e as origens da
família Terra Cambará até o momento do conflito. Os liberais apoiadores de
Júlio de Castilhos venceram os federalistas de Gaspar Martins e Gumercindo
Saraiva, mas em Santa Fé, o universo literário da narrativa épica de Erico
Veríssimo, os federalistas só consideram acabada a guerra quando o neto de Bibiana,
Licurgo Cambará, dono do sobrado, entregar suas armas. A trama é narrada em
contraponto com o início e progressão da povoação do Rio Grande do Sul, na
região das Missões, quando o território gaúcho era disputado entre portugueses
e espanhóis.
Quando
começa O Continente, o ano é 1895 e
a família Terra Cambará está acossada no casarão. Alice espera um filho e passa
mal. Todos precisam de água que está no poço no centro da praça, vigiada por
pistoleiros dos dois lados. Há um corte no tempo, e o leitor é situado nas
Missões Guaraníticas de Santo Ângelo e arredores, então pertencentes à Espanha.
Os personagens centrais são Padre Alonzo, que tem um segredo em sua vida
pessoal e carrega consigo um punhal. Ele se encarrega da catequização do menino
índio Pedro. O padre dá-lhe o punhal de prata, símbolo importante em toda a
narrativa, pois atravessará o tempo nas mãos de determinados membros da família
Terra Cambará.
Pedro
Missioneiro nasce nas Missões Jesuíticas, filho de uma índia estuprada por
algum bandeirante. Revela a capacidade de ter visões fantásticas desde a
infância. Nessa época, 1745, os Sete Povos das Missões, pertencentes à coroa
espanhola, vivem em crescente prosperidade. Com a guerra, Portugal devolve a
Colônia do Sacramento à Espanha e recebe em troca o território das Missões, os
povoados jesuíticos são destruídos e Pedro foge, sendo descoberto por Ana
Terra, ferido, no açude da propriedade da família, paulistas vindos de Sorocaba
para povoar o Continente de São Pedro.
A
família Terra trata do índio, que se afeiçoa a todos. Um dia Pedro seduz Ana
Terra no açude. Ana descobre, pouco depois, estar grávida. Pedro é morto pelos
irmãos dela. Pedro Terra nasce. A família não aceita a criança. Num ataque dos
castelhanos, todos são mortos, exceto Ana, o filho e a cunhada. Para salvar a
vida do filho, ela insiste em ficar na casa, sendo estuprada barbaramente pelos
bandidos. Os sobreviventes veem-se ao desabrigo. Ana decide, então, recomeçar
de novo e parte com um grupo de colonizadores. Chegam às terras do coronel
Amaral, que decide fundar o povoado de Santa Fé. A família Amaral vai se tornar
inimiga dos Terra, até o final de O
Continente.
Pedro
Terra casa-se e tem dois filhos, Juvenal e Bibiana. Quando Bibiana já está
moça, surge em Santa Fé o Capitão Rodrigo Cambará, personagem-símbolo do gaudério
rio-grandense. Oriundo de Viamão e condecorado nas diversas guerras de que
participou, Rodrigo Cambará chega à cidade sem muito propósito, até que põe os
olhos em Bibiana e apaixona-se. A paixão é correspondida, mas o irmão e o pai
não aprovam a aproximação dela com Rodrigo. Além do quê, Bento Amaral tem
pretensões sobre Bibiana, mas a família Terra não o suporta. Há um duelo entre
Bento Amaral e Rodrigo Cambará, Rodrigo vence, mas é traído, quase vindo a
morrer. Quando se recupera, toma jeito e pede a mão de Bibiana em casamento e o
enlace é consentido por Pedro Terra, com ressalvas. Rodrigo, em sociedade com o
cunhado Juvenal, abre um armazém na cidade. Mas, com o tempo, se desinteressa
pelo negócio, pois gosta de barulho, pelear pelo mundo. Bibiana sofre com as
saídas frequentes do marido para outras freguesias. Os dois têm três filhos,
Bolívar, Anita e Leonor. Numa dessas saídas para guerrear, Rodrigo acaba sendo
morto.
Com
a morte do marido, Bibiana vai viver com os filhos na casa do pai, que perde a
propriedade para um tal de Aguinaldo Silva, homem enriquecido através de
empréstimos a juros. No lugar da casa, Aguinaldo ergue o Casarão, onde se situa
o mote central de "O sobrado". Aguinaldo tem uma neta, Luzia, por
quem Bolívar se apaixona e os dois acabam casando. Bibiana tem sérios embates
com a nora, até que arquiteta um plano para que a família Terra Cambará
recupere o Casarão, o que acaba acontecendo.
Durante
o confinamento no Sobrado, Alice Terra, casada com o primo Licurgo, está
esperando o terceiro filho. Eles já tinham Toríbio e Rodrigo Cambará, que será
o personagem principal da segunda parte
da trilogia, O Retrato. Este segundo
Rodrigo é diametralmente oposto ao Capitão Rodrigo, por revelar uma
personalidade de lisura contestável. Floriano, filho de Rodrigo neto, será o
narrador-personagem da terceira parte da trilogia, O Arquipélago. O
primeiro volume de O Continente
termina com Alice Terra enlouquecendo, enquanto espera, com dificuldade, para dar à luz.
O
plano geral de O tempo e o vento é traçar
toda a saga da formação rio-grandense, desde as origens remotas no século XVIII
até o ano de 1946, finalizando a narrativa ao encontrarem-se, mais uma vez, o
tempo da ficção e o momento presente em que o discurso é produzido. A estrutura temporal, portanto tem o passado
reconstruído como uma possibilidade de esclarecer o presente. Apesar disso, a
obra de Erico Veríssimo não é um romance histórico e nem épico, já que a
família Terra Cambará declina moral e economicamente, com o passar das
gerações.
O Continente apresenta em
contraponto o histórico com o social com
seu ritmo próprio e independência em relação ao conjunto do texto. Dentro dessa
moldura, desenvolvem-se vários segmentos, com início, meio e fim, contendo,
portanto, vida própria e autonomia do âmbito da totalidade da obra. Prova disso
é o fato de Ana Terra e Um certo capitão Rodrigo terem sido
lançados como romances independentes no mercado editorial.
http://educaterra.terra.com.br/literatura/livrodomes/livrodomes_ocontinente_11.htm
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Erico
Veríssimo. O Continente vol. 1. Cia.
das Letras, 2004, 416 pp
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