O navegador Marlow alimentava o desejo de
um dia conhecer um lugar escondido no continente africano. Esse sonho alimentado desde a infância era dominado por um mistério fascinante, às vezes
transformado em um lugar escuro, tomado pelas trevas. É que naquele lugar havia
um rio, grande e caudaloso, que se podia ver no mapa, lembrando uma imensa
serpente desenrolada, com a cabeça no mar, o corpo estendido descrevendo curvas
que se prolongavam por uma vasta extensão de terras e a cauda perdida nas
profundezas do continente. Um dia apareceu a oportunidade de
visitar esse lugar. Uma companhia, dessas que
exploravam o marfim no Congo precisavam de um navegador experiente para buscar
um de seus funcionários que havia desaparecido, talvez prisioneiro ou doente.
Marlow aceitou imediatamente e foi com a tarefa de encontrar e trazer o
misterioso senhor Kurtz. A presença ainda desconhecida de Kurtz, assim, passou a ser-lhe uma obsessão. O que sabia dele, até então, era que tinha o dom da expressão. Era uma voz. Queria encontrá-lo vivo. Quando o encontrou, finalmente, percebeu que era,
realmente, um homem notável. Nesse primeiro encontro, Kurtz, com o
olhar fixo que não conseguia ver a chama da vela, mas abrangia todo o universo,
capaz de penetrar nos corações que pulsam nas trevas, resumiu e julgou “O
horror”. O romance de Joseph Conrad (1857-1924) aborda, por um
lado, a desumanização e a violência do colonialismo europeu no continente
africano, notadamente durante o período de comercialização do marfim. Kurtz
representaria a racionalização da violência colonial, o perigo do desaparecimento das sociedades não-ocidentais diante
da expansão europeia. Por outro, desvela a inquietação existencial e o
desregramento do indivíduo, confrontado com a ruptura de laços sociais. Movido
pelo comércio e pela ideia de progresso, Kurtz (representante do colonizador)
assume o direito de subjugar e matar.
Joseph Conrad, nascido na Polônia, exilou-se com a família
na Rússia, onde teve seu primeiro contato com a língua inglesa através do pai,
que era tradutor de Shakespeare. Órfão aos 11 anos, retornou à Polônia, para
viver com um tio. Quando jovem, ingressou na Escola de Marinha, tomando-se,
assim, de amores pelo mar, que lhe havia de marcar toda a vida. Em 1878 passa
a residir na Inglaterra, adquirindo mais tarde a cidadania
britânica. Quando se aposentou da
marinha, por motivos de doença, dedicou-se a escrever romances, tornando-se um dos
mais notáveis escritores da língua inglesa, apesar de sua prosa peculiar. Suas
obras-primas são Lorde Jim e Coração das trevas, que inspirou fortemente
Francis Ford Coppola no filme Apocalypse Now, retratando a guerra do Vietnã, em
que Marlon Brandon interpretou a personagem inspirada em Kurtz.
Conrad, de fato, viveu na África Central por seis meses,
capitaneando gaiolas no rio Congo, conhecendo, portanto, muito bem o ambiente
que retratou em seu livro. A edição da Companhia das Letras tem tradução de
Sergio Flaksman e posfácio de Luiz Felipe Alencastro.
Paulinhopoa2003@yahoo.com.br
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Joseph Conrad. Coração das trevas. SP, Companhia de Bolso,
2008, 184 pp, R$ 21,00
Olá, Paulinho, bom voltar a te ler.
ResponderExcluirSinto tua falta no facebook, mas vejo que é por uma boa razão: a leitura de bons livros e não das bobagens postadas no Face. Abraço. Rosa
Salve, Rosa! Tuas postagens no face nada tinham de bobo. Eram imagens delicadas que sugeriam textos poéticos. Beijo
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