David é filho de pai brasileiro da região de Governador
Valadares (emigrado ilegalmente nos EUA) com uma mexicana. Aos 38 anos é
diagnosticado de câncer no cérebro, tendo poucos meses de vida. Ao sair do
consultório, pensa no sentido da vida
diante dos sintomas do câncer que o levará à morte daqui a pouco. Chega em casa
em põe um disco de sua refinada coleção de jazz. Enquanto ouve a música põe-se
a observar a coisas a seu redor. Não
tinha pensado em deixar o apartamento, mas em algum momento começou a parecer
que seria a ordem natural das coisas. Livrar-se de tudo que havia ali dentro,
esvaziá-lo como se esvaziam os bolsos de uma calça, e depois se livrar dele
também, da vizinhança, das esquinas conhecidas. Começou, assim, a doar as
coisas que tinha à vizinhança.
Quando David vai a uma mercearia asiática no bairro, puxa
conversa com Alex, jovem descendente de
vietnamitas, caixa desse estabelecimento. Depois vai uma segunda vez, agora com
a necessidade de aproximar-se dela. Pensa David: será que todas as pessoas que conhecemos têm alguma função na nossa vida, algum papel a desempenhar? Não precisa
ser algo grandioso. Podemos topar com alguém na esquina apenas para que esse
alguém nos pergunte a direção da rua tal, qual a melhor opção para se fazer uma
receita, será que não precisa de um eletrodoméstico que tenho em casa e quero
me desfazer?
Alex é mãe solteira. Vive com dificuldade, como quase todo
imigrante nos Estados Unidos. Os dois tornam-se íntimos. Quando Alex lhe diz
que nunca conhecera o Vietnã, David começa a alimentar a ideia entre eles, de
conhecerem Hanói. Também seria uma forma de autoanálise, de confrontar sua própria identidade através
da metáfora do deslocamento.
Até então, só conhecia Adriana Lisboa, através das traduções
competentes de duas novelas de Stefan Zweig, Três novelas femininas, e de A
estrada, de Cormac McCarthy. Hanói apresenta uma prosa elegante contada com
delicadeza.
paulinhopoa2003@yahoo.com.br
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Adriana Lisboa. Hanói.
Rio, Objetiva, 2013, 236 pp, R$ 39,90
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