Ida era uma
intelectual norte-americana engajada numa guerra sem cartel contra os
defensores do desconstrucionismo de Derrida, atacando-os pela esquerda, na
grande tradição dos historiadores marxistas. Não tinha um público amplo. Trabalhava
para a elite e contra ela, odiava as pessoas que formavam seu círculo
profissional. Também gostava de segredo, dos encontros clandestinos num hotel
de beira de estrada. Um dia, é encontrada morta em um carro batido, com a mão
direita queimada
Emilio Renzi
(personagem de outros livros de Ricardo Piglia) estava nessa época - década de
1990 - nos Estados Unidos, a convite de Ida para dar uma palestra sobre o
escritor naturalista W. H. Hudson, escritor de língua inglesa nascido na
Argentina e que se interessou pela vida e pelos aspectos físicos daquele país.
Com a morte de Ida, Renzi interessa-se pelo caso. Investigando seu
passado, descobre que tentara sem sucesso viajar a Cuba. Havia, também,
participado de manifestações pela paz, pela descriminalização do aborto, pela
igualdade racial, pelo acesso dos latinos à documentação legal, pelo fim do
embargo a Cuba. Havia, ainda, participado dos grupos que se manifestaram contra
a guerra no Iraque.
Renzi
consegue chegar a Thomas Munk, suposto assassino de Ida. Percebeu que ele era
considerado o exemplo mais bem acabado de um gênio pelos que o conheciam.
Quando desorientado, parecia um tolo, falando confusamente, gaguejando como se
estivesse perdido nas suas próprias divagações. Mas, quando estava em forma,
era deslumbrante, luminoso, inflexível. Alguns analistas apontam que foi na
Califórnia que Tom descobriu a filosofia antitecnológica e começou a sonhar em
fugir para o mundo selvagem.
Munk acreditava
que vivemos numa época de refluxo e derrota. Já não é mais possível construir
grupos clandestinos, pequenas organizações terroristas fechadas, disciplinadas
e eficazes. Essa época acabara. Estamos na época dos homens sozinhos, das
conspirações pessoais, da ação solitária. Só podemos resistir escondendo nossos
pensamentos invisíveis, nos confundindo com a multidão. Somos indivíduos
dispersos, internados nas florestas, perdidos nas grandes cidades, sujeitos em
fuga extraviados nas pradarias. Faz referência a Henry Hudson e a observação
dos animais pampianos. A natureza seria o último refúgio da rebelião.
A
conspiração é o motor dessa narrativa com um suspense ágil e revelador do mundo
contemporâneo. Ricardo Piglia, como tem sido sempre, soube contar uma história
interessante. Eu gostei.
Tradução de
Sergio Molina
paulinhopoa2003@yahoo.com.br
===================
Ricardo
Piglia. O caminho de Ida. SP,
Companhia, 2014, 248 pp.
Preço: 17 a
37 reais o exemplar novo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário