O motivo condutor do drama trágico Fausto é a aposta, feita em
dois planos: no plano terreno, Fausto aposta com o demônio (Mefistófeles) que,
se este lhe desse a felicidade plena, entregaria sua alma ao inferno. No plano
espiritual, a aposta se dá entre Deus e o Diabo, para tentar salvar a alma de
Fausto da danação. No final, Fausto perde para o demônio, que leva seu corpo
para baixo da terra, mas Deus salva sua alma e o leva ao céu. A primeira parte
do Fausto foi composta ainda sob a influência do Sturm und Drang (Tempestade e Ímpeto) alemão, onde a subjetividade
e o sentimentalismo estavam em alta no Romantismo, de forma generalizada.
O Fausto de Goethe
encontrava-se angustiado e isolado da sociedade em uma solidão voluntária,
sentindo-se incapaz de transformar o mundo. Um dia, durante um passeio, é
seguido por um cão negro que ele deixa entrar em sua casa. Mefisto havia se
metamorfoseado nesse cão para tentar Fausto a aventurar-se pelo mundo dos
prazeres terrenos, para curar sua crise existencial. Mefisto propõe-lhe uma aposta: Se a
inquietação de Fausto, se a sua eterna aspiração aplacar-se algum dia e ele
entregar-se a um leito de lazer, à indolência e à fruição hedonista, se
vivenciar um momento de felicidade em que possa exclamar: "Oh, pára!, és
tão formoso!", então Mefisto terá ganho a aposta.
Fausto aceita e Mefistófeles
leva-o a interagir no mundo com todas as sua grandezas (e misérias: os pecados).
Fausto passa a frequentar a vida boêmia e a beber, mas isso não o satisfaz.
Mefisto lhe oferece a possibilidade do amor carnal na figura da jovem
Margarida, Gretchen, moça simples. Mas ele se toma de amores por ela. Mefisto o
distancia de Gretchen, que estava grávida de Fausto e tem um final trágico,
pois foi tratada como prostituta por ter um filho solteira. Gretchen, num gesto
de desespero, mata o filho, é presa e condenada à morte. Fausto vem a saber da
morte da amada e do filho através do irmão da moça, com quem duela e o mata.
A segunda parte, o Fausto II,
terminado mais de 20 anos depois, é de leitura bem mais extensa, e difícil, são
mais de 1000 páginas, onde Mefisto leva Fausto a vivenciar toda a história da
humanidade, partindo dos mitos gregos: Fausto contracena com Helena de Troia,
com os filósofos gregos e demais figuras históricas. No final ele sucumbe, e
morre, entregando sua alma ao demônio. As forças divinas, entretanto,
interferem em seu destino, Mefisto é logrado e Fausto ganha o reino dos céus.
Historicamente, existiu na
Alemanha, mais ou menos no final da Idade Média, um Doutor Fausto, médico,
também mago e alquimista. Era considerado figura esquisita, vivia só na
companhia de um cão preto. Como começava a enriquecer, criou-se a lenda de que
havia feito um pacto com o demônio, em troca da felicidade material. E esse
demônio estava transformado no seu cão preto.
Essa lenda passou à forma escrita, publicada em almanaques e foi
traduzida para o inglês. O dramaturgo Marlowe, da geração de Shakespeare,
interessou-se pelo tema e criou uma peça de teatro, "A trágica história do
Doutor Fausto", publicada mais ou menos em 1592. Goethe (1749/1832),
quando criança, adorava teatro de marionetes e assistiu à adaptação da peça de
Marlowe e ficou impressionado com o tema. Em 1808 publicou sua obra monumental:
Fausto I. Em 1832, quando morreu, veio a lume a segunda parte da tragédia:
Fausto II.
Há uma edição bilíngue confiável
e muito bem reputada da renomada tradutora Jenny Klabin Segall (esposa do
pintor Lasar Segall), que dedicou boa parte de sua vida a traduzir os dois
volumes de Fausto, pela Editora 34. Os dois volumes são em versos, buscando
respeitar a edição original alemã, enriquecida com a apresentação, comentários
e notas de Marcus Vinicius Mazzari. Fausto I tem ilustrações de Eugène
Delacroix e Fausto II, de Max Beckmann.
Existem traduções em prosa do
Fausto, mas é preciso ter cuidado com a procedência e qualidade dessas
traduções. Eu sugiro ao leitor que opte pelo Fausto I da Editora 34, que não
apresenta grandes dificuldade na leitura. Acho que o leitor não se arrependerá.
Afinal, não dá para morrer sem ler o Fausto
de Goethe, também. O preço dos dois volumes da Editora 34 giram em torno de 63
e 80 reais, respectivamente.
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