Ulysses é um
romance com personagens simbólicos, realizando ações simbólicas realizadas,
entretanto, num mundo real, Dublin do dia 16 de junho de 1904. Trabalhando intensamente
o monólogo interior, o irlandês judeu Leopold Bloom vive uma odisseia moderna
no decorrer desse único dia. Além dele, aparecem com destaque sua esposa, Molly
Bloom e seu amigo Stephen Dedalus. Este representa a identidade oculta de
Joyce, não só neste romance, mas em Retrato de um artista quando jovem, em
que narra a infância e juventude de Stephen Dedalus até sua ida à escola, como
interno.
O
romance de 1112 páginas retrata uma viagem ao mundo interior caótico de Leopold
Bloom, parodiando a Odisseia de Homero: Ulisses (Leopold), Telêmaco (Dedalus) e
Penélope (Mary Bloom). Há outros personagens do romance de Joyce que fazem
referências às personagens da obra de Homero.
Joyce faz uso da paródia, como uma técnica narrativa para desfigurar as
obras-primas do passado, fazendo um ataque à própria literatura. Ulysses tem um tom jocoso, satírico.
Leopold
Bloom, um homem comum, judeu mas batizado como católico, é casado há 16 anos
com Molly, cantora de talento, linda e cobiçada. Os dois tiveram um filho
morto depois de 11 dias de nascido. Esse
acontecimento afeta a vida dos dois para sempre. Eles têm, ainda, uma filha de 15 anos que
vive fora de casa, devido a atritos com a mãe.
No
dia 16 de junho de 1904, Bloom sai cedo de casa para acompanhar o enterro de um
conhecido. Ao voltar do enterro, vai ao centro da cidade até o jornal para os
quais presta serviço publicitário. Feito
isso, poderia voltar para casa, mas ele não quer que isso aconteça, por
enquanto. Daí começa, então, sua odisseia que dura 18 horas, em busca de
pretextos para estar na rua até que tenha certeza de que, ao chegar em casa,
sua mulher esteja dormindo. É que eles estão em crise e Bloom sabe que, durante
a tarde, ela irá receber um amigo, Boylan, que ele pensar ser amante dela. A
história ganha fôlego ao retratar, também, a vida de Stephen Dedalus e de Molly, que apresenta no final do romance
um longo monólogo interior. Além dessas três vozes, há inúmeras outras vozes
que se fazem ouvir, tornando a narrativa interessante, mas ao mesmo tempo
complexa.
O
objetivo de Joyce, em Ulysses,
talvez tenha sido o dar uma forma e um significado ao imenso panorama de
futilidade e anarquia que é a vida contemporânea. É uma ficção construída em cima de estruturas
de um mito. Leopoldo Bloom é um cara que sabe sentir, mas que muitas vezes não
tem capacidade de se expressar. Quando consegue a capacidade expressiva,
desaprende a do sentir. Bloom sofre de uma solitária falta de articulação, numa
verborragia aparentemente sem sentido algum. As poucas ideias ou sentimentos
únicos e de sentidos múltiplos são facilmente deformados em clichês
convencionais. Quando Bloom observa, por exemplo uma lingerie numa vitrine, ele diz: "Perfume de
abraços o todo assaltou. Com carne faminta e obscuramente, por adorar ardia
mudo."
Joyce apresenta Bloom como o homem andrógino
do futuro. Mas não antes de definir as necessidades do homem moderno na figura
de Stephen Dedalus, um jovem em fuga do machismo presunçoso do mundo da Dublin
de seu pai. A personalidade de Bloom reflete um espelho partido de muitas
faces. E esse eu que Joyce celebrou em Leopld, um sujeito culto e versátil, que
combina inúmeras vidas passadas em sua própria vida.
Ulysses
apresenta uma mudança de técnica narrativa a cada um dos episódios,
aparentemente autônomos. A obra contém um quadro que discrimina, para cada
episódio, uma cor, uma técnica narrativa, um símbolo, etc, além de atribuir
horários e sentido a cada trecho do livro. Joyce teria elaborado esse quadro
para facilitar o acesso dos amigos ao livro e a seus detalhes.
Há
três traduções da obra em português no mercado: o linguista Antônio Houaiss
apresentou a primeira tradução brasileira em 1966. Foi esta edição que tentei
ler, mas parei na metade por não estar preparado ainda para as inovações formais
de Joyce. Em 2007 saiu a tradução da professora Bernardina Pinheiro, pela
editora Objetiva, à qual ainda não tive contato. Em 2012 saiu a de Caetano Galindo, pela
Penguin/Cia. das Letras, considerada a melhor. É esta que eu li toda e recomendo aos
leitores. Aos que se interessam por literatura de qualidade, recomendo o livro
do próprio tradutor, Galindo, Uma visita
guiada ao Ulysses de James joyce, que busca auxiliar na aproximação do
leitor com a obra.
Tradução
de Caetano Galindo
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James
Joyce. Ulysses. SP
Penguin/Companhia, 2012, 1112 pp.
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