Os Irmãos Karamázov conta a história de uma família e uma comunidade, e
não propriamente de um indivíduo. Ele alterna as histórias de suas cinco figuras
principais em partes sucessivas, às vezes com uma sobreposição de tempo de uma
para outra, criando suspense sem a necessidade de uma intriga. Assim, todas as
personagens estão conectadas com as vastas forças culturais e históricas e os
conflitos morais e espirituais da época, 1870.
O
autor aborda nesta obra-prima, a questão da falência da família russa, que
sofria a perda da fé em Cristo e em Deus. Assim, o conflito entre fé e razão é
colocado como ponto central do romance, apreendido em seu plano moral e
filosófico mais altos.
O
fazendeiro Fiódor Pávlovitch Karamázov negligencia totalmente os três filhos
tidos de duas esposas. Dimitri, o filho mais velho que teve com a primeira
esposa, herdou da mãe o temperamento forte. Sua expectativa, desde jovem, era
herdar da mãe algum dinheiro, quando tivesse a idade para isso. O pai, porém,
tinha enredado de tal modo os bens de Dimitri, que ele ficara sem nada.Ivan, o
filho do meio, era de natureza reservada, introspectiva e era preocupado com as
injustiças do mundo. Aliocha, de 20 anos, o terceiro filho, tinha índole
religiosa, nutria um amor precoce ao ser humano. Para que sua alma pudesse se
ver livre das trevas da maldade, refugiou-se num mosteiro como uma saída de sua
alma para a luz. Smerdiákov, o pretenso filho bastardo, foi assistido pelo
criado da casa de Fiódor, passando a tarefas domésticas.É descrito como uma
pessoa mediana e sádica, destituída de qualquer sentimento natural de gratidão
ou obrigação para com os outros. Desde pequeno zombava da religião. Racionalista,
tinha diálogos primorosos com Ivan, torturado com seus raciocínios morais. Smerdiákov
adquire importância maior, durante o julgamento de Dimitri.
O
fio condutor da trama é sobre o ódio de Dimitri (já integrado ao exército russo)
ao pai, quando se sentiu espoliado da herança a que tinha direito. Como tinha
pavio curto e o cérebro na ponta da
língua, metia-se em constantes confusões, chegando a afirmar, perante pessoas,
que se vingaria do pai. Tinha uma noiva, Cátia, mas era apaixonado por Grúchenka,
uma jovem liberal sustentada por um homem mais velho. Dimitri a amava, mas vivia
com suas rendas quase a zero. Embora Grúchenka tivesse recursos, Dimitri era
orgulhoso, queria levá-la por conta própria e começar com ela uma nova vida.
Ele tinha outro problema de consciência: havia se apossado do dinheiro da
namorada Cátia, que o havia dado a ele para enviar a um parente necessitado.
O conflito
se agrava, quando Fiódor decide entrar na briga para conquistar Grúchenka. Esse
é o ponto central da narrativa, que leva a uma tragédia familiar, envolvendo os
demais irmãos. Há um roubo de dinheiro
na casa de Fiódor e este é assassinado. As suspeitas, obviamente, recaem sobre
Dimitri, que afirma ser inocente, mas é levado a julgamento.
Os
dois longos capítulos em que a promotoria e a defesa traçam sua estratégia de
condenação e absolvição de Dimitri é outro ponto alto no romance. Contêm os extensos discursos dos advogados.
Dostoiévski
se utiliza deles para dar o clima adequado à ação da trama. Os dois advogados
iluminam os problemas morais, espirituais, sociais e políticos que envolvem a
família Karamázov.
Todo
o romance é um primor de construção narrativa. Último romance de Dostoiévski, em
sua fase áurea de obras-primas, é considerado a obra síntese do autor russo.
Tradução
de Paulo Bezerra.
paulinhopoa2003@hotmail.com
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Fiódor
Dostoiévski. Os irmãos Karamázov.SP,
Editora 34, 2008, 1080 pp. em dois volumes.
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