domingo, 7 de agosto de 2011

A vulgarização do afeto

Você já esteve em uma rodinha de amigos, certamente, batendo papo, até que a roda se desfaz por motivo vário e cada um se despede, dá um abaninho e diz: “tchau, um beijo”. O beijo não é dado. É falado. As pessoas estão todas juntas, uma frente às outras, e o beijo sai falado. Entre homens é o afeto falado do “até mais, um abraço”. Puxa vida! Por que não dar um abraço corpo a corpo? Já repararam que muitos homens se abraçam colocando a mão no peito um do outro, para evitar o confronto corpo a corpo mais direto? É da cultura machista. Não tem jeito. Pois é, mas assim é a vida. Pode ser que as pessoas dessa rodinha não sejam grandes amigos a ponto dos lábios tocarem o rosto do outro. Então se usa a tal cortesia de demonstrar um afeto não tão próximo através do beijinho falado e não dado.
Certa vez, quando estava em Brasília montando um curso de linha na Gepes do Banco do Brasil, fui apresentado a uma educadora, dessas chefas com alto cargo inerente à competência de sua função. Muito cortês à primeira vista, chamava-me pelo nome toda a vez em que conversávamos no horário do lanche coletivo. Quando finalizou o lanche, ela desejou um bom final de tarde a todos e a todas (não sei por que dessa moda, pois o gênero “todos” inclui, quem exclui é o “todas”) e propôs que todos ali presentes se dessem um abraço de confraternização. No dia seguinte, cruzamos eu e ela em sentidos opostos no imenso corredor deserto da Gepes. Quando chegamos bem próximos, olho para ela, mas ela ignora minha presença, como se eu não existisse passando por ela naquele momento. Fiquei intrigado. No dia anterior ela propôs um abraço de confraternização. Abraço é coisa séria, gente! No dia seguinte, já propôs que fôssemos anônimos, fingindo desconhecer um ao outro. Essa característica, aliás, é típica de ambientes de trabalho em que há muita gente e não se pode ou não se quer estar “arreganhando os dentes” a toda hora e momento.
Ora, não se trata de arreganhar os dentes a toda hora e momento. Um olhar não tira pedaço de ninguém. Não é preciso nem falar, basta o esboço de um sorriso que a cordialidade está feita. Mas a vida é assim mesmo. Já me disseram que ninguém é obrigado a estar feliz o tempo todo. Eu penso, entretanto, que é possível a delicadeza e a gentileza sem grandes estardalhaços, que daí é exagero falso. Se fôssemos mais autênticos em nossa forma de demonstrar afeto a terceiros, poderíamos, quem sabe nessa tal rodinha, dar um adeus e “até a próxima”. Senão, dá um beijo, cara, não custa nada!

Um comentário:

  1. Adorei também!
    Concordo com tudo!
    Tu deveria incluir também o 'eu te amo' que hoje em dia parece que as pessoas não lembram do significado disso antes de dizer.
    ;)

    Beijos

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