domingo, 29 de agosto de 2010

A felicidade consiste em quê?

Li num blog de cultura, recentemente, uma afirmação creditada ao escritor francês Romain Rolland, de que "a felicidade consiste em conhecer seus limites e amá-los". Uma afirmação importante dessas assim, pinçada ao acaso e fora do contexto em que o autor a citou, pode tornar-se inconsequente a qualquer comentário. Mas, vou puxá-la para um contexto subjetivo e fazer algumas considerações: Puxa vida! Como podemos conhecer nossos limites sem transcendê-los? Os semideuses da mitologia grega buscavam ultrapassar seus limites. Sua hybris (ousadia) suscitava a fúria dos deuses e eram castigados. Daí virem muitas das tragédias gregas que conhecemos: Prometeu foi um titã que criou os homens (com seu irmão Epimeteu) e também roubou o fogo dos deuses para presentear às suas criações. Isso tornou o homem superior aos animais. O fogo era exclusividade dos deuses. Por isso Zeus puniu Prometeu, acorrentando-ao topo de um monte, onde diariamente uma águia dilacerava seu fígado, que diariamente se regenerava. Imaginemos se Prometeu tivesse conhecido e respeitado seus limites, obedecendo sua "natureza"... teria tido uma vida feliz e livre dos castigos. Mas o homem não teria ganho o fogo, princípio de nosso progresso material.
Ícaro tentou fugir de Creta usando asas fabricadas pelo artesão Dédalo, seu pai. Ele deveria voar longe do sol para que a cera que sustentava suas asas não derretesse. Desobedeu a ordem aproximando-se do sol e foi castigado. Suas asas desmancharam e ele caiu no mar. Hoje voamos de forma segura (sem nos aproximarmos muito do sol, claro). Devemos, quem sabe, isso à ousadia de Ícaro, que buscou o desafio de fazer o homem voar como os pássaros.
Então, conhecer seus limites. Um desafio contrário ao dos semideuses. Conhecer a nós mesmos é uma tarefa ingrata, muitas vezes. Não vou dizer que isso é impossível, pois já ouvi muita gente falar que conhece seus defeitos e qualidades, que conhece seus limites e não infraciona a lei natural da existência. Mas eu, sinceramente, não sei dizer se conheço meus limites. Admito que tenho medo, até, de conhecê-los a fundo. Isso me assusta, embora possa ser o caminho da minha felicidade. Deve ser muito bonito conhecer suas limitações e respeitá-las. Mas a minha felicidade ainda não passou por isso. Tive e ainda tenho o ímpeto dos semideuses, de buscar conquistar aquilo que está longe de mim. Traço mil e uma estratégias. Me ferro na maioria delas. Mas as poucas vezes que consegui esse feito me senti feliz. Será que estava ultrapassando aquilo que julgava ser o meu limite, ou estava justamento trabalhando dentro das suas possibilidades... Boa pergunta pra mim: vou pensar a respeito.
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Romain Rolland foi um biógrafo, novelista e músico francês nascido no século XIX e morto em 1944. Dizia, entre muitas coisas, que o pessismo da inteligência não deveria abalar o otimismo da vontade. E agora?

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Ganhos

o que você vai fazer, quando se aposentar? Quero ficar um bom tempo sem fazer nada, depois decido alguma coisa. É bom pensar em algo para fazer, você ainda é novo, 53 anos, há planos, coisas a fazer...
Pois é, coisas a fazer. Mas, o quê? Não sinto vontade de fazer nada, minha vida de trabalhador sempre teve o pensamento e a fala: "não vejo a hora de parar de trabalhar e gozar a vida!" Gozar a vida, pra mim, sempre teve a intenção de não fazer nada. Entenda-se esse "nada" como todas as coisas proveitosas, agradáveis, prazerosas, que não podemos fazer porque estamos trabalhando por obrigação,para construir essa base para o "nada" do que estou falando.
Quando estava envolvido com o processo da aposentadoria do banco onde trabalhava, tive crise: tonturas, expectativas, indecisões. Conversei com Rozana, já fora do banco. Estava em Ibiraquera, morando na praia com seus cachorros e o marido. Feliz da vida. Quem não é feliz da vida perto do mar! Conversei com Gládis, recém-saída do trabalho: "não tenho tempo pra nada!", me disse ela. Quem já está aposentado entende o que ela disse. De fato a gente não tem tempo pra nada. Porque a noção de tempo de um aposentado que preza o "dolce far niente" é outro. Mais curto. O tempo passa depressa. A ruptura dos padrões desse bom pedaço da vida em que produzimos para sobreviver, que é o trabalho ativo, compromissado, de carteira assinada, é uma coisa muito boa. Eu penso assim. Sinto isso. Gostei muito.
Dias desses falei com Zuleide, que se retirou do batente na mesma época que eu. Está fazendo artesanato, reick, passa temporadas na praia quando quer, preferentemente fora da loucura do veraneio. Acompanha a trajetória da filha que corre o mundo, trabalhando numa ong humanitária. Está fazendo nada... que delícia!
Dias desses falei com Valdir, que se transferiu parcialmente para Chapecó. Está feliz com a mudança de ares. Tem vontade de investir num novo trabalho, ele precisa disso. Está perseguindo o que gostaria de fazer, com uma boa remuneração, sem neuras.
Dias desses almocei com Claudinha, Berê e Ricardo, colegas da ativa que ainda têm um caminho a percorrer. Junto estavam Hamilton e Ana, que estavam saindo para "o não fazer nada". Dúvidas? Claro! Mas tenho a certeza de que a liberdade é o melhor caminho para todas as escolhas, mesmo que seja para "nenhuma delas", como é o meu caso.
A aposentadoria incomoda porque acontece no momento em que estamos no alvorecer de nosso envelhecimento. Se envelhecer pode ser uma coisa boa, poderá também ser uma coisa complicada. Melhor dizendo, com algumas complicações, nada que não se possa resolver com nosso plano de saúde. Batalhem pela liberdade, meus amigos! Vale a pena.