domingo, 20 de maio de 2012

A obscena senhora Hilda Hilst

Essa é escritora que você não pode deixar de ler antes de morrer. Pelo amor de Deus! Hilda Hilst (1930-2004) tem vasta obra entre poesia,prosa e teatro. Era bruxa. Viveu sua velhice solitária na Casa do Sol, sua chácara em Campinas, cercada de cães. Durante sua vida sempre foi preocupada com a sobrevivência da alma. Costumava deixar gravadores ligados pela chácara e afirmava ter captado vozes, fragmentos de frases de espíritos. Quase ninguém acreditava nela. Caio Fernando Abreu, escritor místico, era seu amigo e conviveu com ela um tempo na Casa do Sol. Pouco antes de sua morte, conheceu Zeca Baleiro, que musicou poemas seus, gravados no cd Ode Descontínua e Remota para Flauta e Oboé - De Ariana para Dionísio com vozes de Bethânia, Ângela Ro Ro, Zélia Duncan, entre outras. Era admirada por Vinícius de Moraes, Lygia Fagundes Telles e Carlos Drummond de Andrade. Mulher de comportamento avançado, já na juventude, na década de 50 morava sozinha em São Paulo, onde costumava receber pessoas influentes da inteligência paulistana em suas festas. Em determinada fase de sua vida, passou a escrever “textos pornográficos”, sob alegação de que pouca gente, até então, lia suas obras. Trata-se de textos em prosa e poesia eróticas de excelente qualidade, como sempre. Pertencem a essa fase: O caderno rosa de Lory Lambi, Contos d’escárnio, Cartas de um sedutor e Bufólicas. A editora Globo vem relançando toda sua obra, para agrado de público e crítica, algumas já esgotadas.
Se você não leu nenhuma prosa dela, comece por A obscena senhora D. Com cerca de 90 páginas, a narrativa conta a história de uma senhora de sessenta anos que escolhe morar no vão da escada, depois que seu marido morreu. Dali, ela conversa com ele, com alguns moradores da vila onde mora. Também conversa com Deus, a quem chama de “Porco-menino”, “menino-louco”, “menino-precioso”. Em seus diálogos, a mulher quer encontrar respostas. A conversa dela com o marido é sempre o desencontro entre o desejo de ambos. A narradora-personagem acaba, no final das contas, narrando seu desamparo frente à espera de um Deus que a teria abandonado.
Tu não te moves de ti, escrito antes de A obscena senhora D, apresenta uma escritura mais complexa, desenvolvida em três novelas, Tadeu (da razão), Matamoros (da fantasia) e Axelrod (da proporção). Elas compõem entre si uma unidade, relacionada ao tema, onde os personagens se confundem, derramando-se um sobre o outro. O desejo de Tadeu se materializa como personagem na história de Matamoros, para depois, num processo lento de descontrole, perder-se em Axelrod. A autora cria em seus personagens um diálogo de interrogação, quase inquisitorial, chegando sempre a uma espécie de limite.
Se você preferir a poesia de Hilda Hilst, busque na internet que há poemas lindíssimos dela. Em setembro a Folha de São Paulo lançará, da autora, Exercícios, uma reunião de poemas esparsos e alguns inéditos, por R$ 16,90.
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Hilda Hilst. A obscena senhora D. SP, Globo, 2001, 112 pp. R$ 15,00 (nos sebos)
___________ Tu não te moves de ti. SP, Globo, 2004, 184 pp. R$ 20,00 (nos sebos)

Um comentário:

  1. Paulinho, desde a época em que fazia arquitetura (acho que foi em outra encarnação, tanto tempo faz! rsrs), eu tinha fascínio pela Hilda Hilst. Lia tudo que se escrevia sobre ela, mas, estranhamente, nunca li nada dela. Acho que só agora estou madura (pra não dizer velha...rs) o suficiente para entendê-la. Quem sabe eu consiga encarar. Bj

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