quinta-feira, 28 de abril de 2011

Meus dois comprimidos diários de citalopran

Um médico presta serviço humanitário em um dos muitos campos de refugiados africanos, vítimas da violência. Particularmente, está em crise conjugal, tem um filho que pouco vê, devido a seu trabalho no exterior. Esse filho sofre violência física e psicológica intencional de um grupo de colegas mais fortes do que ele, na escola. Um garoto novo, com certa fobia social e bastante agressivo se aproxima do filho desse médico, defendendo-o e envolvendo-o em atos de violência que têm fins trágicos. Esse médico, então, aproxima-se do filho e do amigo, ensinando-lhes que, para não se ter medo da violência, não é necessário revidá-la com atos violentos. Isso parece difícil de aceitar, mas é uma lição de vida. A violência física que oprime as pessoas física e psicológicamente poderia ser enfrentada com palavras e atos consistentes, levando a mudanças de comportamento sem fomentar a violência ainda maior. Não revidar à violência pode ser um ato de honra e de valor. Não significa covardia. Os refugiados do campo de concentração onde o médico atua fugiu da violência, mas tinha medo. Isso é fato positivo. Quando se tem medo do perigo,melhor correr. De outra forma, aprende-se que se pode enfrentar a violência física, enfrentando-a sem realizar atos violentos. Isso envolve o ato de amor ao próximo, sem restrições.
Eu mesmo, em meu universo pessoal, me violentei desde cedo, motivado por uma ansiedade doentia que me provocava raiva e ações indelicadas com as pessoas. Quantas vezes humihei, feri e desrespeitei aos amigos que me rodeavam, por uma violência provocada por sensações de perigo real ou imaginários que me causavam tensões e nervosismo desnecessários, que prejudicavam a mim e ao meu grupo. Essa sensação incômoda que me descrevo não tem a ver diretamente com a violência de causas políticas e econômicas ou de relacionamentos familiares desestruturados. Mas revelava a mesma sensação de enfrentamento e de poder. Essa insatisfação precisou ser trabalhada assim como o médico trabalhou a conscientização do controle do poder para não sufocar o outro.
Descoberta essa insatisfação como ansiedade, fui tratá-la com citalopran e conversar com terapeuta, para me conhecer melhor. Precisei de ajuda e aceitei-a. Assim como somos ajudamos, precisamos de ajuda. Esse trabalho humanitário dos Médicos sem Fronteiras e de outros grupos voluntários que saem à busca dos necessitados, é fantástico. Ajudar o próximo pode significar não apenas dar um pouco do que se tem ao outro, mas ajudar o outro a ter e conquistar o que é seu, sem se deixar espoliar.
O relato inicial desse texto é do filme dinamarquês "Por um mundo melhor". Vejam! Talvez ainda esteja em algum cinema próximo de sua casa.

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