domingo, 27 de janeiro de 2013

Catatau


Levei um tempo para decidir falar do Catatau de Paulo Leminski. É desses livros que quase ninguém leu e talvez não consiga levá-lo adiante, se não tiver fôlego suficiente. Entretanto, vale a pena falar de Catatau pela sua importância como prosa concretista de um poeta igualmente concretista que foi Paulo Leminski. Nascido em 1944, em Curitiba, e morto em 1989, foi escritor, poeta, crítico literário, tradutor e professor. Foi casado com a poeta Alice Ruiz, de quem você deve conhecer o trabalho através das letras de muitas músicas de Arnaldo Antunes e Itamar Assumpção. Leminski também teve poemas musicados por Caetano Veloso e o grupo baiano A Cor do Som. Possuía profundo conhecimento intelectual, foi considerado pela crítica como poeta de vanguarda, talvez por ter aderido à contracultura, publicando seus versos em revistas alternativas. Também foi incluído na geração de poetas marginais da década de 80, apesar de não ter se aproximado dos poetas dessa leva. Travou amizade com Décio Pignatari, Haroldo e Augusto de Campos. Chegou a fazer parte do Grupo Noigandres, surgido inicialmente na década de 50, em São Paulo, para divulgar a poesia concretista, que supervalorizava o caráter gráfico da palavra, proporcionando novos níveis de leitura..Profundo conhecedor da literatura e cultura japonesa, Leminski notabilizou-se com sua poesia curta, fazendo haicais e brincando sobre frases feitas, no jeito próximo a Oswald de Andrade.

Considerado pelo autor um romance-ideia, Catatau, publicado em 1975, fala da   vinda do filósofo René Descartes (no romance chamado de Cartésio) ao Brasil, junto com Maurício de Nassau, durante as invasões holandesas. Cartesio veio aqui para exercer a lógica: penso, logo existo. Cartesio espera a vinda do polonês Artychewsky, também vindo com os holandeses, para mostrar ao filósofo como funcionam as coisas no Brasil quinhentista. Com um cachimbo de “canabis” em uma das mãos, presente de um escravo, e uma luneta na outra, passa a estudar a paisagem e a filosofar de forma verborrágica. Esse discurso é o que sustenta toda a narrativa, visto que o polonês Artyschewsky só vai aparecer na história na última página do livro, podre de bêbado. O livro apresenta de forma satírica o ponto de vista cartesiano sobre o Brasil e o desenvolvimento. O texto, apesar de cansar um pouco, é muito divertido. É bom que seja lido em pequenas doses. Assim o leitor certamente vai se rolar de rir das tiradas de Cartesio, parodiando discursos e jargões conhecidos de nosso imaginário popular.

O “chapado” Cartesio, faz suas tiradas filosóficas. Conta-nos, por exemplo, de um tratado sobre o juiz perfeito, chegando à conclusão de que o juiz seria tanto mais perfeito quanto mais se assemelhasse ao réu, para conhecê-lo e puni-lo com justiça. Assim, o juiz e o réu seriam a mesma pessoa, que se absolvem e fazem as pazes. E arremata: “Quando se come é que se vê como a natureza foi sábia em colocar o boi no prato e o homem na cadeira”. Noutra, “Do mau pau cai o bom macaco, com caco pra cá, outro naco lá para as putas, que me lambdam, me arrepenteiem, me arrebastam, me depressipintam: falai do mau, parai o pau, a pedra, o pacau. Desse coalho – não sai coelho, aquele cacau no cascalho tira água do joelho”. Em mais uma de inúmeras outras: “Fluxo, lago enxuto”.
Catatau seria obra para leitores verticais? Nem tanto. Basta ter senso de humor.

                                                                         paulinhopoa2003@yahoo.com.br

                                                                                                                                                
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Paulo Leminski. Catatau: um romance-ideia. SP, Iluminuras, 2010, 256 pp.  R$ 44,00

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