O pano de fundo do romance é o período da ditadura uruguaia
imposta ao país de 1973 a 1985. A história gira em torno de Santiago, preso
político, e Graciela, sua mulher. Graciela é forçada a pedir asilo na Argentina
com a filha pequena, mais o pai de Santiago, para tentar refazer sua
vida. Em cinco anos de prisão, comunicam-se apenas por cartas esporádicas.
Santiago vive um tempo estático, onde nada de novo acontece. Passa e repassa
as lembranças familiares como forma de se manter livre. A escolha dele, de
lutar contra a opressão, e a dela, de sair do país, levam suas vidas a um rumo
imprevisível. Graciela, ao contrário, precisa seguir em frente, procurando recompor
sua vida com a filha. Cai em uma rotina de mudanças constantes, em que até o
amor pelo marido será afetada, já que Graciela começa a nutrir sentimentos
pelo melhor amigo de Santiago. O romance é contado em várias vozes, inclusive
a de Mario Benedetti, que relata seu drama de exilado político em várias partes
do mundo. Don Rafael, o pai de Santiago, é uma dessas vozes. Sua fala revela a
preocupação de o filho enlouquecer na prisão. É nos
torturadores que reside a loucura. São loucos por vocação e livre escolha, que
é a forma mais ignóbil de loucura. Ganharam aulas de tortura dos
norte-americanos para se diplomarem dementes. Mas isso não acontece. Ao receber uma carta do filho,
sente que sua descida ao inferno não o incinerou. Está são.
Pensa o pai que, mais do que se entregar a uma esperança, o que conta para o
filho é se agarrar à sanidade. E seu filho continua sensato. Está dosando seus
ódios com prudência e sagacidade, o que é decisivo. O pai sabe que é difícil
ter bom senso quando se passou pela humilhação e pelo mutismo obstinado e pelo
asco à morte e pelo alerta sem trégua e pelo pavor solitário e pelo martírio em
cotas incômodas. Depois de tudo isso, agarrar-se à sensatez pode ser uma forma
de delírio. Só isso pode explicar essa ferrenha lealdade ao equilíbrio. Isso
explica o respeito a si mesmo, fidelidade aos demais e sobretudo muita
tenacidade, muita obstinação e uma desmistificação progressiva da morte.
Primavera num espelho partido é uma história sobre as contradições humanas, a busca de sentido na vida. Benedetti compõe um mosaico de impressões e sentimentos, numa história marcante sobre a permanência do amor em tempos sombrios.
Mario Benedetti. Primavera num espelho partido. Rio, Objetiva, 2009, 218 pp, R$ 42,90
Primavera num espelho partido é uma história sobre as contradições humanas, a busca de sentido na vida. Benedetti compõe um mosaico de impressões e sentimentos, numa história marcante sobre a permanência do amor em tempos sombrios.
Mario Benedetti. Primavera num espelho partido. Rio, Objetiva, 2009, 218 pp, R$ 42,90
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