quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

A inserção da literatura de consumo no âmbito da cultura - 1ª parte

Para pensar a forma literária e seu lugar na cultura brasileira, precisa-se começar firmando os pressupostos gerais e algumas referências teóricas básicas para se objetivar os limites da literatura no âmbito dessa cultura.
Entendem-se os limites da literatura nas formas como ela se apresenta, para desvendar os valores de uma época. A crónica, o conto e a canção (como forma substitutiva da literatura poética na atualidade) serão objeto de discussão neste trabalho, como modelos delimitativos presentes na sociedade moderna, isto é, os modelos de expressão artística consumidos pela classe média na atualidade.
Entretanto, para que se possa pensar a literatura dentro da cultura, é necessário que se determine sucintamente o que se entende por cultura, e que se delimite o marco inicial do avanço desse tipo de manifestação literária desde o surgimento da contracultura, lá pela década de 60.
Nelson Werneck Sodré, em sua Síntese da História da Cultura Brasileira, abre o livro apresentando uma definição dicionarizada de cultura (constante do Dicionário Filosófico Abreviado, de M. Rosental e P. ludin, Ediciones Pueblos Unidos, Montevidéu, 1950, p. 104): "cultura é um conjunto de valores materiais e espirituais criados pela humanidade no curso de sua história. Esses valores se expressam através da educação, do progresso, do trabalho, da literatura, da arte e demais instituições afins. Portanto, a cultura é um processo de recriação e por isso supõe em cada caso um espaço social e histórico determinado com marcas próprias."
Existem, assim, estágios de cultura que acompanham épocas históricas. Carlos Alberto Pereira em seu livro O Que é Contracultura , cita o escrito de Luís Carlos Maciel, publicado originalmente no Pasquim, sobre o fenômeno da contracultura, apontando a definição de cultura "como um produto histórico e uma criação arbitrária da liberdade, cujo modelo supremo é a arte." Importa, então, fixar a questão de que a manifestação artística é o símbolo mais completo da expressividade humana.
A necessidade da abordagem da cultura faz-se necessária para situar um estágio específico de sua evolução histórica na década de 60, quando as manifestações populares ganham causa e expandem-se os limites de acesso ao fenômeno cultural, através dos meios de comunicação, principalmente da televisão como fonte de entretenimento e lazer. A partir dessa década, a imagem passa a ocupar o sentido da arte de forma mais acentuada que a palavra escrita.
A televisão pode ser considerada o veículo máximo da massificação da cultura e de tudo o que se quiser fazer para canalizar informações e fixar hábitos e costumes como nenhum outro. Ela poderia abreviar o fim da literatura de grande porte (o romance, por exemplo) e sobressalta a homogeneização de gostos através da imagem? Espera-se que não. Mas, pode-se firmar o conceito de cultura de massa, ligando-o ao veículo de comunicação chamado televisão. A sociedade brasileira transforma-se, da década de 60 para cá, igualando gostos e costumes. E incentivando o consumo.
É importante destacar, que a análise da formalização literária está presente ao momento atual da literatura para a sociedade, com todo o lastro da necessidade de expressar e consumir a obra de arte como mercadoria. Por isso mesmo, a partir do consumo, é importante distinguir que ela assume conceitos um pouco mais restritos, cultura popular, cultura erudita, cultura de massa, contracultura. Toda essa dicotomia de conceitos expressa uma adequação moderna do que vem a ser a a literatura como uma forma de arte em sua acepção moderna, buscando adequar-se à sociedade de consumo.
Cabe, também, pensar como se processou a evolução da literatura dentro da sociedade de consumo. O fato dela ser uma sociedade capitalista, põe a literatura para ser aborvida como mercadoria. Esse dado inquieta, porque torna-se difícil a delimitação, uma vez considerada a arte um produto a ser consumido, da qualidade que classifica determinada forma de expressão como sendo arte ou não, arte boa ou ruim. Que valor possui uma arte popular? O que se dizer da arte massificada (e massificante)? Ou ainda, que tipo de literatura pode ser veiculada como forma de arte para ser vendida?
A cultura popular, embora seja confundida às vezes com cultura de massa, não tem uma correlação qualificativa sinônima uma da outra. A cultura popular, antes tida como uma manifestação natural do ser humano, passou a ser considerada historicamente cultura popular, a partir da criação do proletariado no final do século XIX. Ou seja, começa-se a falar de cultura a partir de uma sociedade urbana estabelecida sobre o capitalismo, o homem vendendo sua força de trabalho, caracterizando a sociedade de consumo. A arte popular passa a ser a arte do proletariado, uma arte mais simples.
A arte erudita, por sua vez, apossa-se da arte popular - não exclusivamente dessa arte popular do proletariado - mas da arte popular como um caráter imanente do ser humano que se manifesta de forma pura, simples, universalmente. A arte erudita sofistica esteticamente as formas de expressão da arte popular, passando a ser consumida por uma classe social aristocrática.
Continua

Nenhum comentário:

Postar um comentário