domingo, 16 de setembro de 2012

Diário da queda

O escritor e jornalista gaúcho Michel Laub(1973)ganhou notoriedade como crítico literário da Revista Bravo há tempos atrás. Diário da queda, seu quinto romance, mescla a técnica narrativa entre ficção e memória. Esse procedimento é a tônica da maioria das narrativas lançadas atualmente. Michel Laub é judeu. Decidiu contar, com alguma crítica aos costumes judaicos, a vida de um personagem desde sua adolescência, quando estudava em um colégio judeu tradicional em Porto Alegre (o leitor deve saber o nome), até a reviravolta que o leva a se afastar da educação e dos costumes judaicos na vida adulta, quando se torna escritor.
Aos treze anos, morou numa casa com piscina. Nas férias de julho foi para a Disneylândia. Tinha um videocassete, uma estante cheia de livros e discos, uma guitarra, um skate, um soco-inglês e um canivete. Até então nunca tinha tido uma namorada. Aos treze anos fez o Bar Mitzvah. A tal escola judaica tinha, entre seus pares, um gói (não-judeu. O termo é também usado pejorativamente)que estudava com bolsa. Apesar do narrador nos dizer que nunca se lembrara de casos de discriminação de judeus em Porto Alegre, um fato marcante protagonizado por ele revela que os estudantes judeus discriminavam pessoas que não são da religião judaica. Durante a festividade de bar mitzvah, o grupo joga o pobre bolsista para cima, para ampará-lo numa cama de gato. Numa dessas, o personagem-narrador retira a mão e o jovem estatela-se no chão, sofrendo consequência graves que o faz usar colete ortopédico por muito tempo.
O narrador, então, passa a ter afeto pelo colega e tornam-se amigos. Não sabe dizer por que se tornara amigo da vítima. Isso não teria acontecido por pena de alguém, ou porque passara meses torturado com a hipótese de quase ter destruído aquela pessoa, embora isso possa ter sido o impulso no primeiro esforço de aproximação. Não fosse isso, não teria se oferecido para ajudá-lo com os estudos. Dessa reflexão fazem parte também as trajetórias de seu pai, com quem o protagonista tem uma relação difícil, e de seu avô, sobrevivente de Auschwitz que passou anos escrevendo um diário secreto e bizarro. São três gerações, cuja história parece ser uma só; são lembranças que se juntam de maneira fragmentada, como numa lista em que os fatos carregam em si tanto inocência quanto brutalidade. O narrador chega a questionar qual a diferença do massacre de judeus em Auschwitz com o massacre do colega em sua festa de aniversário. Michel Laub faz parte dos escritores de origem judaica que lutam contra ela. O autor interpreta a tradição no que tem de petrificado, pondo sua experiência de vida em questão, explorando a dimensão ética e política da memória.
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Michel Laub. Diário da queda. SP, Cia. das Letras, 2011, 152 pp. R$ 38,50

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