domingo, 7 de dezembro de 2014

O caminho de Ida

Ida era uma intelectual norte-americana engajada numa guerra sem cartel contra os defensores do desconstrucionismo de Derrida, atacando-os pela esquerda, na grande tradição dos historiadores marxistas. Não tinha um público amplo. Trabalhava para a elite e contra ela, odiava as pessoas que formavam seu círculo profissional. Também gostava de segredo, dos encontros clandestinos num hotel de beira de estrada. Um dia, é encontrada morta em um carro batido, com a mão direita queimada

Emilio Renzi (personagem de outros livros de Ricardo Piglia) estava nessa época - década de 1990 - nos Estados Unidos, a convite de Ida para dar uma palestra sobre o escritor naturalista W. H. Hudson,  escritor de língua inglesa nascido na Argentina e que se interessou pela vida e pelos aspectos físicos daquele país. Com a morte de Ida, Renzi interessa-se pelo caso. Investigando seu passado, descobre que tentara sem sucesso viajar a Cuba. Havia, também, participado de manifestações pela paz, pela descriminalização do aborto, pela igualdade racial, pelo acesso dos latinos à documentação legal, pelo fim do embargo a Cuba. Havia, ainda, participado dos grupos que se manifestaram contra a guerra no Iraque.

Renzi consegue chegar a Thomas Munk, suposto assassino de Ida. Percebeu que ele era considerado o exemplo mais bem acabado de um gênio pelos que o conheciam. Quando desorientado, parecia um tolo, falando confusamente, gaguejando como se estivesse perdido nas suas próprias divagações. Mas, quando estava em forma, era deslumbrante, luminoso, inflexível. Alguns analistas apontam que foi na Califórnia que Tom descobriu a filosofia antitecnológica e começou a sonhar em fugir para o mundo selvagem.
Munk acreditava que vivemos numa época de refluxo e derrota. Já não é mais possível construir grupos clandestinos, pequenas organizações terroristas fechadas, disciplinadas e eficazes. Essa época acabara. Estamos na época dos homens sozinhos, das conspirações pessoais, da ação solitária. Só podemos resistir escondendo nossos pensamentos invisíveis, nos confundindo com a multidão. Somos indivíduos dispersos, internados nas florestas, perdidos nas grandes cidades, sujeitos em fuga extraviados nas pradarias. Faz referência a Henry Hudson e a observação dos animais pampianos. A natureza seria o último refúgio da rebelião.

A conspiração é o motor dessa narrativa com um suspense ágil e revelador do mundo contemporâneo. Ricardo Piglia, como tem sido sempre, soube contar uma história interessante. Eu gostei.

Tradução de Sergio Molina
                              
                      paulinhopoa2003@yahoo.com.br
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Ricardo Piglia. O caminho de Ida. SP, Companhia, 2014, 248 pp.

Preço: 17 a 37 reais o exemplar novo.


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