domingo, 29 de julho de 2012

Caderno de ruminações

Sergipe é um estado que muitos passam por cima, quando vão da Bahia para os outros estados do Nordeste. Uns dizem que é por causa da água escura do mar de Aracaju, parecida com a de nosso litoral gaúcho. Eu, que gosto de lá, conheço praias de águas claras calmas e agradáveis, como a Praia do Saco, coladinha à Mangue Seco. O cânion do São Francisco também fica em Sergipe, no município de Paulo Afonso. No plano da literatura, há sergipanos importantes e famosos, como Joel Silveira (1918-2007), jornalista e contista. Você deve lembrar do imbróglio que teve com Zelia Gattai, quando ela se candidatou à vaga deixada por Jorge Amado na Academia Brasileira de Letras. Joel fez campanha contra, chegou a se candidatar para tentar impedi-la de ganhar o posto. Não adiantou. Foi eleita. Se você teve um bom professor de Literatura, deve-se lembrar de Tobias Barreto (1839-1889), filósofo, poeta, crítico e jurista brasileiro, nascido naquele estado. Sílvio Romero (1851-1914), famoso crítico literário que escreveu sua famosa Introdução à História da Literatura Brasileira.
Atualmente, dois escritores de Sergipe têm se destacado nas letras nacionais, sendo publicados por editoras importantes como a Companhia das Letras e a Alfaguara. São eles Antonio Carlos Viana (1946), contista que obteve fama com seu livro O meio do mundo e Francisco J. C. Dantas (1941), romancista que se destacou com o romance já consagrado, Coivara da Memória. Esses dois autores são sangue novo à nova literatura do nordeste, que ficara estagnada em Graciliano Ramos e Jorge Amado, para citar alguns do cânone modernista.
Francisco J. C. Dantas lançou recentemente Caderno de Ruminações, narrando quatro dias que antecedem o casamento de Rochinha, o anti-herói da história. Médico proctologista, tinha pai humilde que vendeu suas poucas terras para custear a faculdade do filho. Rochinha, um cara íntegro, profissional idealista que pratica a saúde com escrúpulos e direiteza, acaba pagando um preço muito alto por isso. Tenta inúmeras vezes uma vaga na saúde pública, mas não tem o perfil de quem vá angariar votos para os políticos que comandam a rede de saúde. É forçado a exercer a medicina em lugares longínquos, de gente miserável, até que se dá conta de que, pra vencer na vida, precisa abdicar de alguns princípios que lhe passaram e trair o próprio juramento. Tem de arranjar um respaldo muito forte, cultivar boas relações com certos colegas, laboratórios, chefes, e separar direitinho a quem prestar favores ou fazer concessões.
O problema de Rochinha é que ele não consegue deixar de ser íntegro na sua profissão. Adquire fama e dinheiro com rapidez, mas seu dinheiro e seus bens são desgastados por sócios inescrupulosos e um primo que lhe tem inveja. A derrocada moral de Rochinha ocorre, quando se decide casar com uma prima rica e libertina.
Francisco J. C. Dantas começou a escrever na idade madura, aos 50 anos. Foi professor de Literatura Brasileira e Portuguesa na Universidade de Sergipe e na Universidade da Califórnia.
==============================
Francisco J. C. Dantas. Caderno de ruminações. Rio, Alfaguara/Objetiva, 2012 402 pp. R$ 49,90








Nenhum comentário:

Postar um comentário